Cuiabá celebra 306 anos: Tradição, cultura história às margens do Rio Coxipó

Compartilhe:

Da antiga Forquilha à metrópole do Centro-Oeste, capital mato-grossense reforça sua identidade com celebrações e memória histórica

No dia 8 de abril de 2025, Cuiabá completou 306 anos de fundação. O marco histórico remonta a 1719, quando, às margens do Rio Coxipó, no local conhecido como Forquilha, foi fundada aquela que viria a se tornar uma das mais importantes cidades do Centro-Oeste brasileiro. Ao longo de três séculos, Cuiabá transformou-se, consolidando-se como capital do Estado de Mato Grosso, com raízes profundas na história do Brasil colonial e uma identidade cultural vibrante e multifacetada.

A fundação oficial da cidade foi registrada por Pascoal Moreira Cabral, que assinou a ata de criação do povoado. O ato não foi apenas simbólico, mas estratégico: tratava-se de garantir, à então Capitania de São Paulo, os direitos sobre as minas de ouro descobertas na região. Era o auge do ciclo do ouro, e a presença dos bandeirantes paulistas foi determinante para a ocupação do território mato-grossense. Registros históricos indicam que os primeiros vestígios da passagem de exploradores datam de expedições realizadas entre 1673 e 1682, lideradas por Manoel de Campos Bicudo, um dos pioneiros na travessia dos sertões.

Poucos anos após sua fundação, em 1727, Cuiabá foi elevada à condição de vila, recebendo o nome de Vila Real do Senhor Bom Jesus de Cuiabá, em homenagem ao padroeiro. Já em 1818, a vila conquistou o status de cidade, e, em 1835, passou a ser oficialmente a capital da então Província de Mato Grosso — posição que mantém até hoje.

Em 2025, a Prefeitura de Cuiabá, por meio da Secretaria Municipal de Cultura, em parceria com o Governo do Estado, preparou uma vasta programação comemorativa para celebrar os 306 anos da cidade. As festividades incluíram eventos culturais, competições esportivas e ações sociais voltadas para a população, todas oferecidas gratuitamente, com o objetivo de envolver a comunidade e resgatar o orgulho cuiabano por sua trajetória e patrimônio.

As ruas do centro histórico foram palco de apresentações musicais, exposições de arte, intervenções urbanas e encontros gastronômicos que destacaram a rica culinária regional. Além disso, atividades esportivas e recreativas foram realizadas em diversos bairros, buscando descentralizar as celebrações e alcançar todos os cantos da cidade.

Cuiabá, carinhosamente chamada de “Cidade Verde”, continua a se reinventar, sem esquecer suas raízes. Ao celebrar mais de três séculos de existência, a capital mato-grossense reafirma seu papel como guardiã de tradições e como espaço dinâmico de encontro entre passado, presente e futuro.

Cuiabá já teve inverno de verdade?

A memória do “frio cuiabano” nos anos 90 ainda aquece o coração de quem viveu aquela época

Hoje conhecida por seu calor escaldante, com temperaturas que frequentemente ultrapassam os 40 °C, Cuiabá nem sempre foi sinônimo apenas de sol e calor intenso. Quem viveu na cidade nos anos 1990, especialmente os cuiabanos mais antigos, lembra com nostalgia da chamada “estação do frio” — um período que, embora curto, fazia a cidade experimentar temperaturas surpreendentemente amenas.

Naquela época, entre os meses de maio e agosto, não era raro os termômetros registrarem mínimas entre 12 °C e 15 °C, com sensação térmica ainda mais baixa nas madrugadas. A frente fria que descia do sul do continente chegava com força à região Centro-Oeste, e Cuiabá, apesar de sua localização em uma área de clima tropical, era tomada por ventos gelados e um céu mais cinzento, principalmente em junho e julho.

Durante esses meses, a cidade mudava de comportamento: os cuiabanos tiravam os casacos do armário, as praças se enchiam de cafés e comidas típicas quentes — como arroz com pequi, chipa e caldo de piranha — e a cidade ganhava um charme diferente, quase serrano. Era o tempo dos cobertores reforçados e das manhãs de neblina leve, que hoje parecem quase lenda urbana diante do clima atual.

Com o avanço das mudanças climáticas globais e o aumento da urbanização desordenada, esses invernos mais frios tornaram-se cada vez mais raros e curtos. Atualmente, quando uma frente fria chega a derrubar a temperatura para 18 °C, já se considera um evento digno de repercussão nas redes sociais. O frio cuiabano virou uma espécie de patrimônio afetivo — uma memória viva que insiste em resistir nas conversas de fim de tarde e nos relatos saudosos de quem viu Cuiabá tremer de frio, nem que fosse por alguns dias.

🧣 Curiosidade: Quando Cuiabá tinha um inverno de verdade

Apesar de ser conhecida nacionalmente como uma das capitais mais quentes do Brasil, Cuiabá já teve seus dias — ou melhor, seus meses — de frio memorável. Nos anos 1980 e 1990, era comum os cuiabanos se prepararem para a chamada “estação do frio”, que durava, em média, de dois a três meses, entre o final de maio e o início de agosto.

Durante esse período, influências de massas de ar polar vindas do sul do continente conseguiam alcançar o Centro-Oeste com maior intensidade, trazendo temperaturas baixas que deixavam a população surpresa e até animada. As mínimas chegavam facilmente aos 13 °C ou 14 °C, e algumas madrugadas registravam 10 °C — algo impensável nos dias atuais. Com o tempo seco típico da estação e os ventos frios, a sensação térmica era ainda mais baixa.

A rotina mudava: as pessoas saíam mais cedo de casa bem agasalhadas, o cheiro de café quente tomava conta das manhãs, e as comidas típicas de inverno ganhavam protagonismo, como o caldo de mandioca com carne seca, o arroz com pequi e os caldos quentes servidos nas ruas e nas feiras.

Embora o frio não durasse tanto quanto em regiões do Sul ou Sudeste, ele se fazia presente de forma consistente por cerca de 60 a 70 dias, com algumas quedas bruscas de temperatura que duravam até uma semana inteira. Era um frio curto, sim — mas intenso o suficiente para marcar a memória de gerações.

Hoje, o frio cuiabano é raro e, quando aparece, dura poucos dias e com intensidade muito mais branda. Ainda assim, a cidade celebra cada frente fria com empolgação quase folclórica. Afinal, para quem vive em uma das capitais mais quentes do país, um ventinho de 19 °C já é motivo para tirar o moletom do armário e postar nas redes: “Hoje tá frio em Cuiabá!”

🗣️ Curiosidade: As gírias cuiabanas que só quem é da terra entende

Além de seu calor lendário e sua culinária de dar água na boca, Cuiabá também se destaca por seu jeito único de falar. O sotaque arrastado, as expressões cheias de humor e a criatividade popular formam um dialeto que é praticamente um patrimônio imaterial da cidade.

As gírias cuiabanas misturam influências indígenas, africanas, portuguesas e do interior brasileiro, criando um vocabulário próprio, cheio de cor e identidade. Quem não é da região pode até estranhar no começo, mas basta um tempo em solo cuiabano para começar a repetir — e se apaixonar.

Confira algumas das gírias mais clássicas e curiosas de Cuiabá:

  • “Eita lasqueira!” – Expressão de espanto ou surpresa. Pode ser usada tanto pra coisa boa quanto ruim. Ex: “Eita lasqueira, olha o preço desse peixe!”

  • “Tá virado no siri” – Quando alguém está bravo, impaciente ou de mau humor. Ex: “Fulano tá virado no siri hoje, deixa ele quieto.”

  • “Num guento não, moço!” – Forma exagerada de dizer que algo é difícil de aguentar, seja o calor, uma situação, ou até uma risada. Ex: “Esse calor, num guento não, moço!”

  • “Pé rachado” – Modo carinhoso de se referir ao cuiabano raiz, nascido e criado aqui. Ex: “Sou cuiabano pé rachado, com orgulho.”

  • “Tá estirado igual sucuri no sol” – Usada pra descrever alguém muito preguiçoso, largado, descansando sem compromisso. Ex: “Domingão só fico estirado igual sucuri no sol.”

  • “Devagar quase parando” – Quando alguém está andando muito lento, ou fazendo algo sem pressa nenhuma. Ex: “A fila tá andando devagar quase parando.”

  • “Moage” – Coisa, bagunça, confusão. Serve pra quase tudo. Ex: “Esse trem aí é só moage, sai fora.”

  • “Trepando no toco” – Quando a situação está ruim ou a pessoa está sofrendo as consequências de algo. Ex: “Gastou tudo no jogo e agora tá trepando no toco.”

Mais do que palavras, essas gírias revelam o modo de vida cuiabano: bem-humorado, direto, cheio de metáforas e com forte vínculo à terra e à oralidade. É um jeito de falar que une gerações e reforça o sentimento de pertencimento a uma cidade com personalidade própria.

🗣️📍 Gírias cuiabanas que só quem é “pé rachado” entende!

1️⃣ “Eita lasqueira!”

👉 Expressão clássica de espanto, admiração ou surpresa.
📌 Ex: “Eita lasqueira, esse peixe tá do tamanho de uma canoa!”

2️⃣ “Tá virado no siri”

👉 Quando a pessoa está nervosa, impaciente ou brava.
📌 Ex: “Deixa ele quieto, tá virado no siri hoje.”

3️⃣ “Num guento não, moço!”

👉 Usada pra reclamar de algo difícil de aguentar (geralmente o calor!).
📌 Ex: “Esse sol das duas da tarde? Num guento não, moço!”

4️⃣ “Pé rachado”

👉 Cuiabano raiz, nascido e criado, com orgulho e sotaque forte.
📌 Ex: “Sou cuiabano pé rachado, uai!”

5️⃣ “Estirado igual sucuri no sol”

👉 Pessoa largada, preguiçosa ou só relaxando mesmo.
📌 Ex: “Feriado tô só estirado igual sucuri no sol.”

6️⃣ “Devagar quase parando”

👉 Quando tudo tá lento demais. Pode ser fila, pessoa ou ônibus.
📌 Ex: “Esse trem tá indo devagar quase parando!”

7️⃣ “Moage”

👉 Confusão, bagunça ou coisa mal feita. Uma palavra pra tudo!
📌 Ex: “Sai fora dessa moage, só dá dor de cabeça.”

8️⃣ “Trepando no toco”

👉 Quem tá sofrendo as consequências, passando aperto.
📌 Ex: “Gastou tudo na festa e agora tá trepando no toco.”

Compartilhe:

Publicar comentário